Devaneios... Nada mais...

quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Insónia ( IV )

(continuação)

Na parede o relógio marca 12h25. Surpreendentemente estou algo impaciente… Será que a Sofia está a afectar-me de algum modo? Não pode ser… Praticamente que não a conheço… Não acredito muito nessas coisas de amor à primeira vista… Se bem que nunca se sabe… À porta do Capa Negra, olho para os dois lados da rua… Não a reconheço entre as inúmeras pessoas que passam… Resolvo entrar para a recepção e fumar 1 cigarrito. No momento em que chega estou a apagar o cigarro. Depois daquele ritual de cumprimentos lá vamos para a mesa e lá começa a conversa…

- Cigarros… Isso é coisa de putos… Não achas que já tens idade para ter juízo?
Esta mulher não me deixa de espantar… Falámos duas vezes e conversamos como se já fossemos amigos de longa data…

- Concordo plenamente… Já pensei em deixar de fumar várias vezes mas para isso tenho de querer… Estou à espera da oportunidade e motivação – explico-lhe.
- Isso cheira-me a desculpa de mau pagador…

Fiquei sem fala… Não tenho como responder… Felizmente fui salvo pelo empregado que veio trazer a ementa…

Durante alguns segundos reina o silêncio enquanto lemos a ementa… Confesso que estou algo receoso que o almoço se torne numa daquelas situações constrangedoras em que ninguém sabe o que dizer…

De súbito o silêncio é interrompido.

- Já decidiste o queres almoçar? A mim está mesmo a apetecer-me uma francezinha. Já não como uma há muito tempo…

É incrível. Mais uma surpresa… Uma mulher que não se preocupa com quantas calorias tem o almoço, quanto tempo e o que vai ser necessário fazer para queimar essas calorias…

- Acho que para mim também vai ser.

Faço sinal ao empregado e lá mando vir duas francezinhas e dois finos.

Entretanto começa a tocar o meu telemóvel. Por favor que não seja a Ana… E não é mesmo… É o Luís. É o míudo que está a dar os últimos retoques na versão do relatório final que a minha equipa tem de entregar.

- Boa tarde engº Ferreira. Desculpe mas estou aqui com um problemazinho…

Bolas!!! Lá vem a história do problemazinho outra vez… Se é um problemazinho porque é que ele me está ligar??? Que mania de reduzir estas coisas ao “inho” Ainda por cima deve ser um problema como o último… “Sr. Eng.º: Acabou o tinteiro… Não consigo imprimir…” O que é que eles acham querem que faça? Que vá substituir o tinteiro?

- Luís... é assim: estou a almoçar. Se é um problemazinho, deixe de se comportar como um funcionariozinho, faça o seu trabalhinho e se quando chegar o problema ainda estiver resolvido, trato de ver o que posso fazer.
- Desculpe Sr. Eng.º… Não sabia que estava ocupado, vou tentar então resolver isto sozinho…
Nem me apercebi da resposta que dei… À minha frente a Sofia sorri.

Peço-lhe desculpa e explico a história dos “problemazinhos” que os funcionários têm, de como insistem em telefonar-me por coisas sem importância e como estou farto de ser interrompido por causa disso, perdi um pouco a cabeça…

- Percebo totalmente. Tenho uma empresa de Design Gráfico. As pessoas às vezes não têm noção nenhuma da realidade… Acontece-me montes de vezes. Aqui há uns dias faltou a luz e telefonaram-me a perguntar o que deviam fazer…

É engraçado… Ela transmite uma segurança fantástica. Deixa-me totalmente à vontade…
Entretanto a conversa evolui de uma forma assombrosa… Começamos a entrar em pormenores absolutamente fantásticos para serem ditos a alguém que mal se conhece… Desde partilhar experiências de férias, situações embaraçosas que nos aconteceram, lembranças de infância, romances falhados… Enquanto isso vou pensando numa maneira subtil de lhe perguntar se tem um caso com alguém neste momento… Mas para que raio quero saber isso? Ando interessado na Ana. Não devia meter mais uma pessoa na equação… Iria complicar-me muito a vida…
Quando estou com a Sofia o tempo parece que voa… Já são duas e meia. Nunca estive tanto tempo neste restaurante num almoço de um dia trabalho… e no entanto queria ficar mais…
Peço a conta ao empregado.

Tiro a carteira e pago. Ela insiste que deve pagar o almoço dela.

- Nem penses. –digo – Fui eu que convidei e tenho agradecer-te o enorme favor que me fizeste…

- Ok. Mas não penses que isto fica assim… -retorque

Boa! Descobri como hei-de saber se anda com alguém…

- Hmmm. Então amanhã à noite pagas-me o café… Pode ser?
- Amanhã… quinta-feira… pode ser. Liga-me a combinar. – diz-me sorrindo.

Pergunto-lhe se quer que a deixe em algum lado mas ela veio na sua viatura.
Sinto-me incrivelmente leve. Este almoço deixou-me totalmente rejuvenescido. Nem parece que passei a noite em claro.

Mal chego ao escritório o Luís vem ter comigo e diz-me, sorridente, que conseguiu resolver o problema e que tenho a versão final do relatório na minha secretária à espera para eu o reler e dar o meu aval para entregar ao director.

Nem quero saber qual foi o problema que ele teve. Ainda bem que está acabado. Vou ler o relatório rapidamente, entregá-lo e hoje o meu dia vai acabar cedo.

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